Visões turvas de momentos passageiros de lembranças onde
corriam odores e murmúrios, trouxeram até mim pessoas que
recordo e outras com quem sonho.
Uma brisa gelada investiu contra mim.
Com os olhos envenenados de lágrimas desejei o refúgio
do teu olhar fugidio, numa inquietude sem nome, enquanto
a cidade se ia esbatendo sob um hálito de névoa azulado,
que subia na minha pele como fios de seda.
Fingindo estar ali observei as ruas em silêncio, aspirando o
perfume das meretrizes.
Embriagado de náusea invoquei os deuses com quem nunca
me cruzei, seguindo a minha sombra deformada nas paredes.
Regressei lentamente da excursão infinita, com décadas atrás de mim,
despertando de um transe, sem me ver, enquanto a voz encantada
dos pássaros, mensageiros dos ventos, voava para as árvores centenárias
que surgiram sem ruido e eu, mais do que nunca, desejei voar.
azeredo negrão / (antónio sérgio pinto azeredo)